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segunda-feira, maio 29, 2006

Grayscale 

Suddenly, it all fades. Truth, I mean. And colour.

Work. No point. What for? Oh, right. Money. I need it. Keep that in mind this time.

Weakness. Feeling hypotonic. Walking down the street feels like walking in a pool.

Sun burns. Shadows are cold. It all feels very stupid.

No need for food. The books you keep buying and don’t read anymore.

Opinions. You used to have opinions. They felt good.

You wake up and all your little problems have grown into willow trees.

You come home and those eyes. Those eyes that keep you breathing.

You feel like breaking down and that voice. That voice that holds your balance.

You are at the edge of losing it and those hands. Those hands that stop you from tearing apart.

And days pass. You are just waiting for your life to start again. Eyes closed and the old tic tac in your chest, lying.

In the meanwhile, those eyes. Those eyes that keep you breathing.

segunda-feira, maio 22, 2006

Choques de cinza com azul 

À hora de dormir, me deito sentindo a sua falta. Sentindo falta do que sou do seu lado, do que sou sob os seus olhos. À noite, tanta coisa falta para qualquer coisa.

Acordo aconchegada no sonho da sua presença, só para levar o choque frio do amanhecer cinza contra as minhas persianas azuis. O mundo sopra lá fora e levo alguns minutos no trabalho de me resignar. Resmungo, chuto a coberta e no caminho até o banheiro, suas meias no chão me elevam em um suspiro que repuxa o meu peito e eu vou, flutuando, arrastando as pontas dos dedões dos pés no chão gelado.

Essa sua capacidade de estar em todos os lugares. Na mancha do tapete, no copo esquecido, no cheiro do travesseiro, no botão do elevador. E esse seu jeito de estar não estando vai esticando o meu coração para trás.

Pego o ônibus e quase sempre separo dinheiro para duas passagens. Depois, fico olhando a nota azul na minha mão, com uma nota triste nos olhos que não vêem ninguém no banco ao lado. A manhã cinza contra o azul das minhas mãos vazias de você.

O concreto das paredes, em blocos, iguais, umas depois das outras, muito juntas e muito irmãs. Eu ando o corredor de chão preto e brilhante e o eco me é companhia sem consolo. Só um par de passos, só uma linha de eletrocardiograma, só um sibilar gentil de respiração. O eco só me faz ouvir, de fora para dentro, o que já ouço de dentro para fora: a falta de contratempo.

Vem o meio-dia, cinza de chumbo, derretendo as arestas da cidade e amolecendo os joelhos e as espinhas das pessoas. Vem o meio-dia, a metade torturante de uma coisa que só existe quando não é só metade. Vem o meio-dia e se choca em uma lufada sufocante de vento fervente contra meu olhar perdido pela janela azul. Faço força para só chorar na sua frente e o vento espicha a minha mente para trás.

A tarde passa e repassa, em blocos de uma hora. A tarde passa várias vezes, esperando a hora de finalmente passar em definitivo, e a tarde vem cinza e metálica, trovoando contra o quase-silêncio do azul-transparente da folha em branco. Gasto a ponta dos dedos procurando palavras que não dizem nada do que quero dizer. O tempo passa e empurra a minha saudade para fora do meu peito.

A noite cai, devagar e de vez, com a surpresa daquelas coisas que vêm tão lentamente que a gente não nota. A noite vem cinza grafite contra os exércitos de luzes azuis da cidade. Meus ombros pendem e trazem o passado à tona. O cansaço me furta um suspiro e ele sai com o teu nome.

O sono não vem e a insônia cinza-veludo joga os meus pensamento da popa à proa. Uma torrente de pensamentos inacabados me prende nos poros dos minutos, jogada de porão a porão, sem conseguir estabelecer horizonte ou convencionar um norte. Exausta da sua falta, caio para dentro e busco nos sonhos um jeito azul, bonito e triste, de recomeçar, para enfim trazer o fim desse dia cinza.

sexta-feira, maio 19, 2006

XI 

Porque ela é linda, sabe. Ela é.

Tem gente que pára e fica olhando. Eu não, eu acho feio ficar olhando assim para ela.

Tem quem ache de encher os olhos d'água aquela espada enorme que ela carrega. Eu acho mesmo que ela segura a espada só porque tanta gente acha que ela devia. Acho que de noite, quando não tem mais ninguém na rua, ela apóia aquela porcaria pesada, senta e toca, que nem aquele cara que toca serrote.

Tem gente que fica fazendo discurso porque ela usa uma venda e isso e aquilo mais. Eu acho que ela fica é de olhos bem abertos, kubrickianamente abertos. E ela deve revirar os olhos quando essas pessoas ficam falando da venda e coisa e tal. Eu sempre pisco para ela e acho que ela vê. E pisca de volta.

Tem sempre alguém para implicar com a balança. Porque a balança tem que estar reta, a balança tem que pender para um lado. Eu acho que ela fica mordendo a língua para não descer a balança na cabeça de quem fica assim, de venda, descendo a espada uns nos outros, por causa da posição relativa da imagem da balança.

terça-feira, maio 16, 2006

Pedestais de carne 

Ele fala e cospe. Sentados da varanda, todos nós, como romanos pós-romanos, sentados em espreguiçadeiras de plástico pós-plástico. Aquela fumaça enebriante, enjoada e deliciosa, de sentir-é-quase-saber-e-saber-é-quase-fé. Sentimos o cheiro da nossa superioridade, mais feroz ainda que predadores com a boca suja de sangue: presas feitas predadores, operários feitos czares, patéticos artistas medíocres feitos Führers.

Ele fala e cospe. É o líder dos Titãs planejando derrubar o Olimpo e bêbado da própria perfeição. É uma explosão furiosa de lava, irrompendo e libertando finalmente seu futuro glorioso, arremessando aos ares as toneladas de poeira-terra suja e inútil que pesaram sobre ele. Que ele, posteriormente, deixou que pesassem sobre ele. Mas agora já chega; ele está pronto.

Ele fala e cospe. As pessoas à sua volta não parecem se importar com isso. As pessoas à sua volta são precisamente o tipo de gente que se importaria com isso. Bebem de suas palavras e o fazem macho-alfa. Pedestais de carne crescem sob seus pés. Eu observo e me apavoro porque sei que o corôo também.

quarta-feira, maio 10, 2006

Mil Folhas 

Arrumando a estante, me vejo ilhada entre pilhas e poças. De livros. As pontas dos dedos grafitadas de escamações do tempo morto deixam marcas ao se misturarem com o suor vivo.

Arrumar me é uma tarefa tão penosa. As possibilidades começam enxutas, práticas, firmes, jovens. Fortes. As memórias vão pingando em gotas imperceptivelmente pequenas e incomensuravelmente múltiplas. Devaneios aparecem, devagar de repente, como mofo, alargando o veio das idéias inúteis e deixando ao pragmatismo pouco espaço para manobrar o brucutu da disciplina.

Um alemão bigodudo me olha, apoiado no meu colo. Finge que ignora meus shorts, mas no antebraço que apóia a cabeça eu vejo a abotoadura e adivinho. Aperto os olhos e o mantenho no meu colo. Afasto o paletó da cintura, mostro o revólver no coldre e abro a contracapa com uma luva de pelica. Perco a paciência e fecho a porta de vai-e-vem. O livro no meu colo, de volta. Fico pensando se não estamos numa daquelas brigas de antípodas, eu e o alemão, ele contra meus shorts, eu contra as abotoaduras do seu prefácio. Ele acha que não e continua sem nem me olhar, virado de lado. Viro o livro para olhá-lo nos olhos mas só encontro o flanco. Palavras pairam acima de sua cabeça e descubro que me falta o ponto: “Como alguém se torna o que é.”

Falta um ponto. “Como alguém se torna o que é?”, pergunto à última prateleira, onde se vê uma coleção de lombadas amarelas. Começo a achar o alemão um estupor por aquele ponto final de vista. Ponto de interrogação ortodoxo. Cara de coruja seca. E bigoduda.

Perco a paciência de novo e pego o livro velho, amarrotado e sujo de suco do meu lado. O suco não devia ter muito de suco, porque a cor radioativa da mancha não se esvai, mesmo que o amarelado do papel faça inútil o carbono 14. A capa ainda é azul escura e acho que eu também. Abro o livro e vejo, marcada nas páginas. uma fotografia da época em que as minhas perguntas estavam deixando de ser duelos com os outros e passando a ser xadrez de um. Foi mais ou menos a época em que troquei os joelhos ralados por manchas roxas de trombar nas coisas. E tirando o pó, vem “o que sou?” por baixo de “como me tornei?”.

A pilha de recortes escorrega e tomba. Fico pensando que, pelo formato da soma das partes, ela voltará a tombar. Muito provavelmente. Depois, tento descobrir se devo reerguê-la mesmo assim, se devo apoiá-la entre livros mais pesados ou se devo aceitar o nascimento de um novo formato de pilha e um novo conceito de estável. Essa encruzilhada consome meus fluídos por demais e decido que preciso não decidir.

Levanto, vou até a geladeira. Bebo água do gargalo, do jeito que me foi devidamente desaconselhado e proibido. Fecho a porta, a luz provavelmente apagou lá dentro, e verdades de ímã de geladeira.

Olho de esguelha para o alemão e não sei se ele ri comigo ou se ri de mim.

quinta-feira, maio 04, 2006

Crucificação de Judas 

Cruz não nasce em árvore. Alguém faz a cruz, alguém bota a cruz no caminhão, alguém lixa a cruz, alguém pinta uma logomarca na cruz, alguém compra a cruz, alguém assina a nota fiscal, alguém assina a lei da cruz, alguém bate palma, alguém bate o martelo, alguém prega.

Para que diabo serve culpa, se não para aliviar outras culpas, borrar tudo, apontar para o lado e dizer que se está certo, ao afirmar o erro alheio? na segunda e na terceira pessoas, se é que pessoas se deixa ser.

E foda-se o plural, né? Só se salva a primeira do plural porque é primeira. Porque no nós o que interessa mesmo é não negar o eu. Só tem plural para não negar o singular.

É. É foda, mesmo, mas todo mundo tem sangue nas mãos. A merda toda, todo mundo quem fez, dez centavos por dia, um cigarro por hora, um jornal a menos em outubro. Todo mundo tem essa porra dessa culpa que querem colar nas minhas costas.

E eu não vou mais ser pseudo-estóica e fazer a gentileza de chorar escondido, porque eu não sou mais aquela garotinha. E eu não vou mais bater em ninguém, para não colarem a culpa na minha testa e ainda me olharem com pena. Eu não sou mais aquela bomba relógio.

Mas também não sou mais um bambu, dobrando no vento. Não sou. O vento me quebrou e eu não sou mais um bambu. Não consegui, dessa vez. Quem sabe numa próxima.

Chega de bastas. A caixa branca rachou.

Sou contra a crucificação de Judas.

Às 5 horas a luz é boa? 

Porque eu quero luz boa.

Pra ver os respingos. Pra ver a merda em detalhes. Os detalhes que ficam por dentro do monte de merda que acha que tem mesmo um coração de carne por dentro. Por dentro, não tem porra nenhuma, porque não tem nem porra. Por que é que tem que ter? Tem é merda mesmo.

O que tem por fora é o que tem por dentro. Igual, só que mais molhadinho.

Então que pisem. Pisem na merda. Enfiem até a canela. Mas vão olhar os respingos.

(Respingo. Tá ouvindo os cliques? Tá ouvindo?)

O ar evapora antes mesmo de chegar perto porque sabe que nem adianta.

A tal da mão invisível do Adão. A tal mão invisível de cada Mr. Smith. A mão invisível vem e empurra a sua cabeça pra baixo. É, lá pra baixo.

Aí. Aí mesmo.

(tá ouvindo as bolhas? Tá ouvindo as bolhas estourando?)

E a gente fecha os olhos com medo de explodir. Prende a respiração, tapa os ouvidos, cola os joelhos no peito, escorrega pela parede e fica lá. Deixando escapar a pressão que não se puder agüentar, baixinho, aquele som molhado e agudo.

Para quê?

Eu vou me explodir em praça púlbica. Mas que a luz seja boa, porque eu quero que vejam a merda toda. A merda toda. Por dentro. Os detalhes.

(resmungando sozinha, achando que ninguém está ouvindo. Aí, um barbudo do meu lado:)

5 horas a luz é ótima.
Todo mundo vai ver a merda.
Mas vão limpar muito rápido.

(eu pisco, olho para ele e nem acredito que alguém ouviu naquela freqüência.)

Será que fixador de perfume fixa cheiro de merda?

(ele pondera, balança a cabeça em um "acho que sim". Na Uruguaiana, a gente lembra. Faltam duas estações.)

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