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quarta-feira, abril 16, 2008

Bobagem 

Ai, deixe de bobagens.

Eu sei perfeitamente que chove, não me amole com riscos. Quem tem medo de riscar a lataria acaba com o motor empenado.

Lá vem você de novo com cinema-restaurante. Hoje não. Hoje eu quero pés-na-grama-caderno-bicicleta.

Quando foi que você parou de tocar aquele violão azul? A gente compra tantos cds e nunca mais escreveu nenhuma música.

Hoje me deu na telha inventar ideogramas. E casamento ia ser duas pessoas-palito dormindo bem abraçadinhas, banco ia ser um quadrado escrito com tinta que some em meia hora, amor ia ser um pingo de tinta um tanto roschard.

Hoje me bateu no estômago uma vontade doida de ter um forninho, uma bigorninha, martelos e alicates – pegar pedaços de metal e bater, misturar, amassar, queimar, entortar, cortar, até virarem anéis.

Hoje eu sentei na pia tomando café, balançando os pés e fui tomada de desejo de comprar um piano de parede: já percebeu como os pianistas fazem cara de quem está trepando com o universo?

Então, deixe de bobagens. Chegue em casa com um vinho doce, que eu já resolvi: vou fazer um ofurô para colocar debaixo do nosso chuveiro, que acho muita idiotice desperdiçar água e carinho.

Lembra de quando a gente cantava o tempo todo? A gente tinha uma dança do espaguete e o balé da má notícia.

Aí, de repente, eu acordo hoje e você ameaça explodir porque compramos escovas de dentes da mesma cor. Ora bolas.

Deixe de bobagens. Dá cá a escova, que eu puxo uma grande tesoura da gaveta e corto a ponta da escova que é minha. Pronto. Agora, vamos comemorar tudo com a dança das gentes maravilhadas com o extraordinário fato de gostar da mesma cor de escovas de dente.

Hoje eu cansei de ler e de anotar o que os outros dizem. Como é que isso me ajuda a saber o que eu tenho a dizer?

E o que eu quero dizer no momento é que decidi que já chega. Vou renovar minha carteira de motorista e comprar uma bicicleta.

Sabia que quando a gente coloca uma pulga dentro de um pote com um vidro em cima, a pulga aprende a só pular até a altura do pote? Mesmo se a gente tira o vidro, a pulga passa o resto da vida no pote.

Sabia que elefantes ficam presos em estacas porque eles só tentam fugir quando ainda são pequenos demais para arrancar a estaca?

Então. Bicicleta e carteira de motorista. E nada de sapato apertado, nunca mais.

Lembra de você fotografando a minha formatura e eu de beca, capelo e all star? Quando foi que a gente parou de inventar histórias policiais antes de dormir?

Hoje eu decidi ligar para a Rec e perguntar se ela ainda anda de bicicleta. A minha enferrujou encadeadada e nem presta mais.

Lembra da gente contando histórias de tombos? Lembra de quando a gente sempre tinha uma mancha roxa ou uma cicatriz nova para mostrar? Lembra de quando eu cismei que ia aprender a andar de skate e você achou lindo mercúrio-cromar o meu joelho todo ralado no formato da África?

Ai, quando foi que começamos a pensar em creme hidratante de cupuaçu com colágeno? Lembra de quando creme para a gente era festa do chantilly na batedeira – e na bochecha valia 5 pontos, no nariz 10 e na testa 15?

Lembra daquele feriado em Petrópolis? A gente de boca cheia de caramelo e os bolsos redondos de cheios de papel melado. E depois aquele chapéu de bobo com guizos e tudo, cantando Los Hermanos pela ladeira de paralelepípedo: “Eu que controlo o meu gui-do-on!”

Ai, vai... Deixe de bobagens.

Eu fiquei no sofá de madrugada porque a insônia derruba gasolina no meu sangue, você sabe muito bem disso. Não tem nada a ver com "acho-que-não-te-amo-mais-vou-ficar-uns-dias-na-minha-mãe”.

Lembra de você sem roupa na cachoeira congelante de madrugada cantando – berrando! – que ia se afogar de tristeza, que nem a Virginia Woolf, se eu não entrasse lá e te desse um beijo?

Bem, deixe de bobagens.

Foi, eu sujei todo o banheiro com serragens. E cortei o dedo na serra. E plantei margaridas amarelinhas na privada do banheirinho. Agora, põe o vinho nesse balde de gelo aqui, entra no diabo do ofurô, cala a boca e me beija.

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