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quinta-feira, setembro 21, 2006

Aquela História Do Rio 

Eu não soube o que fazer, quando você pediu para sofrer sozinha, porque eu achava que você tinha o direito ao silêncio, mas não o direito de me pedir para não estar ali.

Eu quis dizer alguma coisa, uma coisa qualquer que te deixasse à vontade para me deixar do teu lado, mesmo que você quisesse chorar. Eu quis que você me deixasse ser um lampião, para que eu não me sentisse tão terrivelmente impotente. Eu quis não poder chorar a dor de te ver triste, em vez de chorar a dor de não poder fazer nada.

Como alguém que tem que ouvir o irmão apanhar no quarto ao lado, sentindo que é indecente chorar mais alto, mesmo que seja para evitar ouvir. Estando tudo assim, não disquei os números, com eu queria. Compreendi que às vezes as pessoas preferem que não sejam defendidas nem ajudadas, por vários motivos diferentes.

Abri a janela acima da minha cama, com um certo esforço, que fazia muito tempo que eu não abria aquela janela. Sentei no parapeito, como sempre fazia, que senti saudade do vento frio. Senti vergonha de lembrar da minha tristeza passada, ou talvez nem tão passada assim, porque já não consigo dizer o que ela era, se é que algum dia já soube. Acho que hoje fico triste por ter ficado tanto tempo tão triste com coisas que eu nem tenho o consolo de lembrar ao certo quais foram, para dar tapinhas nas minhas costas.

O vento frio era o mesmo, e não era o mesmo, da mesma forma que a minha tristeza era a mesma, ainda que não fosse exatamente a mesma. Aquela história do rio.

Talvez isso seja muito tolo da minha parte, mas sempre que me sinto por demais oprimida, fecho os olhos e sinto um par de asas se abrindo. Acho que deva ser algum resquício de informação genética, da época em que eu era alguma coisa mais parecida com uma ave abrindo as asas para parecer maior, fechando os olhos para não ter que ver os dentes me esmagando sem se importar, ao mesmo tempo que para evitar demonstrar a fragilidade daquele truque.

Se pudesse, abria minhas assas marrons e me precipitava no vento frio. Sem casaco, para sentir a pele arder junto com o peito, queimando com o esforço. Pousaria no seu parapeito e seria sombra.

Estranho pensar em como são diferentes, os dois parapeitos. Acho que vivia sentada no meu parapeito porque ali era o mais longe dali que eu conseguia estar, como um condenado que fica pendurado nas barras da janela. Já a tua janela é o oposto e, de certa forma, a cópia mais perfeita, como antípodas: é o limite entre meu querer entrar e meu querer não-querer entrar.

Seria sombra, velando sem ser notada, presente sem ser parte. Chorando em silêncio para não cometer a indecência de meu desespero de impotência se fazer mais notável que a sua dor. Te dando a solidão de presente, sem ter que te deixar sozinha.

quarta-feira, setembro 13, 2006

Pulsos e Tornozelos 

Quero. Muito. De muitas formas diferentes, juntas, embrenhadas e indiscerníveis como um ninho de cobras. Quero tanto, de tantas formas, em um tempo tão curto que me parece único, que não sou capaz de compreender quase nada além do mero fato de querer. Então, por um instante tão fugaz que me parece unitário, sou capaz de enxergar a existência de vários quereres, mas estão todos tão juntos que logo perco novamente a capacidade de distingui-los uns dos outros. O fato da minha consciência ser logo após esmagada pelo querer só dificulta a tarefa de expressar as diferenças que mal pressinto.

Quero. Quero. Quero em pulsos, de forma que passo de um estado em que sou só uma pequena parte de mim, que observa esmagada o querer inchar, a um estado que nem sei se posso chamar de estado, já que passo a ser o próprio querer. Como um pulso de luz obliviante, o querer ultrapassa meus limites e é mais que a soma dos meus elementos, o amarelo. Pulso de luz. Querer.

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